Documento de Dissolução do Comité Executivo do
II Encontro Mundial dos Estados Gerais da Psicanálise

Este Documento se propõe a encerrar a função executiva que coube a este comitê na realização do II Encontro Mundial dos Estados Gerais da Psicanálise, realizado no Rio de Janeiro em 2003.

A seguir, comentamos alguns dos aspectos mais relevantes do seu desempenho, que apresentamos para a apreciação de todos.

I.
Os destinatários da Convocatória para o Mundial-Rio responderam de forma suficiente e competente ao chamado para o debate plenário que lhes fora proposto. Assim, mostraram estar de acordo com as urgentes idéias centrais propostas para a discussão e com a forma plenária de debatê-las. Entendemos que esta é a maior prova de sua realização, plural e autodeterminada.

II.
Podemos, pois, afirmar que o II Encontro Mundial se revelou como acontecimento, na medida em que demonstrou o poder de convocatória próprio do Movimento dos Estados Gerais da Psicanálise, iniciado no ano 2000 no I Encontro Mundial em Paris e atualizado agora no Rio.

III.
A sua missão foi definida em função de um duplo desafio: dar conta de um temário altamente interpelativo do saber e da prática psicanalíticos e oferecer o necessário espaço supra-institucional para consegui-lo, a saber, constatar até que ponto é possível implicar os psicanalistas com o mundo atual, num encontro fora das instituições a que pertencem.

IV.
Além da sua peculiar temática, a singularidade do Encontro foi também afirmada na sua forma de funcionamento como assembléia geral permanente, que, no exercício de sua soberania, deu plenas garantias de expressão para todos os participantes.

V.
Igualitariamente, por escrito ou de viva voz, todos os psicanalistas que se sentiram interpelados pela Convocatória puderam se manifestar, assim como puderam escutar seus pares a respeito de questões do interesse comum.

VI.
O sucesso prático desta função-assembléia provou, historicamente, que os psicanalistas do mundo podem, mesmo que de forma provisória, prescindir temporariamente das suas institucionalidades para se autoconvocar e debater os temas que lhes dizem respeito.

VII.
Entendemos que o tema central do Encontro, "Atualidade no Psicanalisar", foi a chave que mobilizou os psicanalistas e fez com que o Encontro fosse datado, histórica e politicamente. A contemporaneidade nos reuniu, para além das bordas institucionais que historicamente nos separam.

VIII.
A pertinência dos argumentos com que sustentamos a necessidade de tematizar os grandes problemas do mundo atual e os modos de ser psicanalista foi demonstrada pela adequação dos escritos apresentados e pela consistência dos debates. Desta forma, o político se renovou como idéia central e fundadora do II Encontro dos Estados Gerais da Psicanálise.

IX.
Alem de discutir abertamente sobre questões como Estado, novas ciências, mídia, globalização, cultura e subjetividades contemporâneas, os psicanalistas reunidos no Mundial-Rio provaram que é possível não recuar diante dos males emergentes do mundo em que vivemos: a guerra, o terror, a violência, o totalitarismo e todas as formas de sofrimento próprias de nossa época foram discutidas ... até o limite do suportável. Talvez nisto resida o mérito maior da assembléia: ter dado suporte ao confronto das diferenças e ao embate das contradições que nos implicam como psicanalistas, como sujeitos e como intelectuais.

X.
A qualidade, pertinência e relevância dos trabalhos apresentados para o Encontro constituem a maior prova da riqueza de idéias que os psicanalistas podem produzir quando convocados pelos Estados Gerais, para além das suas escolas e filiações. Podemos afirmar que o conjunto dos textos apresentados constitui uma valiosa referência para todos aqueles – psicanalistas ou não - que se sintam afetados pelos instigantes temas tratados. Por este motivo, acreditamos que o arquivo de artigos do Mundial-Rio representa, desde já, uma indispensável biblioteca de consulta para quem se interessa pelo estudo do atual.

XI.
A função-leitor se revelou como dispositivo suficientemente competente para dar conta do seu objetivo: oferecer para a assembléia geral (e não apenas para os grupos componentes) uma leitura implicada e não-neutra dos trabalhos publicados previamente. Assim, foi possível superar a leitura puramente descritiva por parte dos autores dos textos, tão própria das reuniões congressuais. A adoção da função-leitor provou que, além de propiciar uma escrita original, os Estados Gerais podem gerar também uma leitura original, com a peculiaridade de transformar-se durante sua execução e que produz um efeito de reconhecimento do que é comum, e não apenas do que é autoral-individual. Isto indica que, além de falar e escrever com alto grau de singularidade, os psicanalistas de nosso movimento mostraram que também sabem escutar e ler o que seus pares produzem.

XII.
Com efeito, a característica principal dos debates do II Encontro Mundial foi o entusiasmo com que foram acompanhados por todos. O plenário soube conter o contraditório - por vezes literalmente gritante - dos debates provocados em torno das temáticas ou provocado – também literalmente - pela fala dos conferencistas. Ao mesmo tempo, a intensa vontade política em debater temas tão complexos foi igualmente galvanizada pelo plenário, ficando expressa no vigor com que se manifestou em diversas oportunidades.

XIII.
A escolha dos convidados do Mundial foi a tarefa mais difícil de ser definida. Contudo, acreditamos que o resultado foi proveitoso: quatro grandes intelectuais aceitaram discutir conosco os problemas próprios de nossa época. A intensidade das polêmicas geradas chegou a ponto de colocar à prova a capacidade de tolerância que os psicanalistas podem manter sem, no entanto, fazê-los recuar do seu propósito de manifestar-se livremente.

XIV.
A divulgação do Evento foi integralmente realizada com recursos próprios e garantida por sucessivas apresentações destinadas ao público interno do Movimento (instituições psicanalíticas, universidades, etc.) e à grande imprensa, responsável por alcançar o público em geral. Devemos destacar que o II Encontro Mundial despertou um considerável interesse jornalístico por tratar de assuntos julgados como de interesse público – e não apenas da classe -, e como tais veiculados na mídia.

XV.
Na gestão política interna foi possível manter os canais de consulta e deliberação desimpedidos de entraves burocráticos e hierárquicos, de maneira que a participação dos âmbitos regionais foi proporcional a seu próprio desempenho. O atendimento ao intenso fluxo das comunicações internas foi suficiente para garantir um nível adequado de informações compartilhadas. A publicação dos artigos apresentados foi garantida pelo pleno funcionamento do meio de acesso que o II Mundial manteve com o site dos Estados Gerais da Psicanálise. O uso do correio eletrônico, por sua parte, facilitou a atualização da correspondência mantida com participantes locais e estrangeiros.

XVI.
Decidimos optar pela auto-gestão financeira para a realização do Mundial e a presença dos participantes deu prova do acerto da escolha. Em coerência com o espírito auto-gestivo do Movimento, o Encontro pôde prescindir do agenciamento do risco por outros, assim como de todo tipo de patrocínio e apoio material. A prestação de contas que endossa estas afirmações se encontra disponível para exame e verificação.

Cumpridos os enunciados deste Documento, este Comitê declara a autodissolução do II Encontro Mundial dos Estados Gerais da Psicanálise e se congratula com todos os que o realizaram.

Comitê Executivo